Já sabia que ser mãe ou pai dá trabalho, já sabia que é difícil escrever uma linha intelectual com privação de sono a longo termo, já sabia que era quase impossível ter uma carreira académica sendo mãe, sobretudo em contexto de crise económica. não trocava nada pela saúde do meu filho. nada. às vezes custa, às vezes queixo-me, mas nada paga o amor, nada me dá mais energia do que vê-lo a cantar. também me queixo das energias que gasto com a gestão do dia-a-dia com os meus filhos "emprestados" sobretudo nas férias, do futebol jogado em casa, dos jogos do computador e do imaginário masculino criativo e esgotante (que não conhecia se não através dos comics do Calvin & Hobbes).
E queixo-me que a minha liberdade a fazer coisas sozinha se restrinja às idas ao supermercado (felizmente gosto) e torno-me chata de tanta queixa real e canalizada para gritos. já sabia que a realização pessoal passaria para segundo plano, em conjunto com a realização pessoal das minhas amigas na mesma situação. já sabia que não viveria amargurada com estas certezas porque haveria gargalhadas infantis cá em casa, dilemas adolescentes para resolver, coisas importantes para cada um. O que não sabia era que o tempo se podia multiplicar tanto e encolher tanto, não sabia que haveria tempo num dia para arrumar as coisas, trabalhar, ir ao médico, ao supermercado, à farmácia, ver meio episódio de uma série, ler metade de uma página de literatura na cama e 10 de artigos no barco, não sabia que o tempo também podia encolher, e que um dia inteiro em casa com um filho doente parecia um ano inteiro. não sabia que os problemas são ultrapassados mais depressa, que nunca mais ficaria a matucar numa ninharia mais do que o necessário. não sabia que seria budista à força, um dia de cada vez. não é por acaso que há deuses representados em criança. não sabia que a minha vida e a minha família eram um romance russo acelerado. não sabia que ia manter o espanto e a vontade de aprender. é só preciso um bom intervalo de cinco minutos (dantes precisava de dias para refocar). ser feliz dá muito trabalho, e nunca se pode largar o objectivo de nos mantermos de pé.
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